O suor ainda escorria em seu rosto quando ela decidiu parar numa praça, próximo ao local onde costuma caminhar. Sua respiração estava ofegante. O coração ainda batia forte devido ao ritmo acelerado dos últimos minutos. O ar que entrava pelos pulmões de Luana tinha que dividir espaço com a fumaça de alcatrão da cannabis, que invadia a traquéia e entupia os alvéolos – filtro natural dos pulmões.
Seus músculos, há pouco explorados, começavam a relaxar, e o pensamento, longe, viajava no tempo. Luana não acha que maconha faça mal. Para ela, o fato de ser uma erva “natural” exime a droga dos problemas que afetam a saúde física e mental, como maior incidência de infecção nas vias pulmonares, bronquite crônica e probabilidade de câncer. Quanto ao cigarro de tabaco, que fuma numa média de cinco vezes por dia, ela tem mais consciência. O entorpecente quase não lhe proporciona prazer, isso está fazendo com que diminua o consumo por conta própria. Essa vontade de diminuir o consumo de nicotina foi inspirada pelo handball, praticado duas vezes por semana.
No caminho de casa, Luana põe os óculos escuros para esconder os olhos ao longo do trajeto. Chegando ao apartamento, ela toma banho e deita na cama para estudar.
Depois de revisar as últimas anotações feitas na aula do dia anterior e de ler algum trecho da apostila, ela vai ao computador e passa o resto da manhã conversando com amigos através de um programa de mensagens instantâneas. As horas passam à espera do almoço, quer dizer, à espera da “sesta”. Costumeiramente, uma amiga liga para Luana quase todos os dias depois do meio-dia, chamando-a para fumar um “baseado”.
A tarde surge no relógio em busca da noite. Às 18 horas, ela já está pronta para ir a faculdade. Para compor o visual, Luana usa muita maquiagem no rosto, cabelos perfeitamente escovados e arrumados. No antebraço vai uma pulseira dourada grossa, com pedras transparentes. Coloca uma sandália de salto alto da mesma cor da pulseira, uma saia jeans um pouco acima dos joelhos, um cinto dourado e uma blusa branca com detalhes da cor do cinto. Na bolsa branca, além do estojo, com lápis, caneta e borracha, e da maquiagem, vão três cigarros de maconha, dentro do maço do cigarro de tabaco.
Luana é uma das poucas privilegiadas deste país. Ela está em mais da metade do curso de jornalismo de uma faculdade particular, graças ao salário dos pais. Pelos dados de 2006, do Ministério da Educação, o Brasil possui pouco mais de 4 milhões de jovens matriculados nas universidades. Essa quantidade fica ainda mais irrisória quando se contabiliza o número de jovens com idade ideal para estar no ensino superior, ou seja, entre 18 e 23 anos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revela que esse número é de pouco mais de 20 milhões.
Fumar maconha e assistir à aula pode ser considerado um desafio pela ciência, já que a droga costuma ocasionar falta de atenção. Mas a ciência também explica que isso ocorre apenas quando se consome em doses altas. Consciente ou não disso, Luana costuma assistir às aulas após ter fumado doses baixas de marijuana, o suficiente para não “bater onda”, provocando apenas relaxamento e euforia. Para saber se o hábito a estava prejudicando, ela desenvolveu uma técnica. Toda vez que entra “fumada”, ela desenha uma estrela do lado da data da folha do caderno e, quando está em casa, compara com os escritos que não contêm o sinal. O que pôde perceber foi que sua mente ficava mais atenta e ágil para perguntas, aumentando sua participação na aula. Suas notas, pelo menos, não a deixam mentir. Ela costuma passar sempre direto, além de receber boas notas nos trabalhos da faculdade.
As teorias de Luana vão além. Ela acha que sua agilidade de raciocínio ao fumar maconha se repete em outras pessoas. “O que noto comigo, e com uma série de amigos que observei, é que o raciocínio fica mais rápido. Eu fico mais lerda na sala quando estou sem fumar”.
Não são apenas esses os efeitos percebidos por Luana. A criatividade também é melhorada. “Quando estou lúcida tenho várias idéias, mas elas não conseguem ser desenvolvidas, elas existem, mas não consigo externá-las. Já quando fumo maconha, me sinto mais criativa e com um estado de espírito muito melhor para produzir”.
Esse “auxílio” à criatividade não é apenas estimulado em trabalhos da faculdade ou na produção de matérias jornalísticas feitas para faculdade, mas também em provas. “Só consigo fazer prova onde precise desenvolver um raciocínio, se estiver muito ‘doida’, ‘fumada’. Nesses momentos, consigo ter um desempenho muito melhor do que quando estou sã”.
Mas usar maconha não é uma regra para todas as vezes em que faz uma avaliação. Ela reconhece que essa técnica não funciona bem na hora de fazer uma prova mais objetiva, em que é preciso memorizar certos conceitos. Nesses casos, sua memória recente se perde. Isso acontece pelo uso crônico da cannabis.
Na faculdade, ela usa maconha antes de entrar para assistir às aulas, no intervalo e depois, quando sai com os amigos de carro e vão fumar em Villas do Atlântico, local próximo à instituição onde estuda, na cidade de Lauro de Freitas. Desde os 17 anos, quando o consumo começou a aumentar, ela passou a usar a droga quase que diariamente, até chegar a um estágio em que fuma, no mínimo, três cigarros de maconha por dia. Houve épocas mais intensas que a atual, quando ela era acordada pelos amigos chamando-a para fumar na casa de alguém.
//Continua no próximo capítulo